OS MOVIMENTOS OPERÁRIOS E O SOCIALISMO
Autores:
Olga Maria A. Fonseca Coulon e Fábio Costa Pedro
Apostila: Dos Estados Nacionais à Primeira Guerra Mundial, 1995, CP1-UFMG
A Questão Social
A Revolução Industrial deu início, na segunda metade do século XVIII,
ao processo de mecanização das fábricas, que continua ininterruptamente
até nossos dias. A industrialização consolidou o modo de produção capitalista,
pelo qual o empresário burguês concentra em suas mãos os bens de produção,
enquanto o trabalhador vende sua força de trabalho por um salário.
A introdução das máquinas deteriorou as condições de trabalho e de vida
dos operários, gerando a chamada "questão social". 0 grande número de
homens, mulheres e crianças a procura de emprego aviltava cada vez mais
os salários. A jornada de trabalho se estendia por 15 horas ou mais, visto
que as máquinas podiam funcionar sem parar. Os edifícios das fábricas
eram inadequados, com ambientes fechados, insalubres, mal iluminados.
Não havia segurança no trabalho, causando constantes acidentes e muitos
produtos utilizados faziam danos à saúde. Como o manejo das máquinas era
simples, cresceu o emprego de mulheres e de crianças, cujo trabalho recebia
menor remuneração, trazendo mais lucro ao empresário.
Mal alimentados e mal pagos, os operários habitavam bairros das cidades
industriais sem qualquer infraestrutura de água e de esgotos; moravam
em cômodos nos quais a família vivia em promiscuidade, convivendo com
doenças intestinais, tuberculoses, alergias, asmas, raquitismo, etc. Ao
referir-se a um desses bairros operários de Londres, em viagem realizada
em 1840, assim se expressou Friedrich Engels: "Não há um único vidro de
janela intacto, os muros são leprosos, os batentes das portas e janelas
estão quebrados, e as portas, quando existem, são feitas de pranchas pregadas.
( .... ) Aí moram os mais pobres dentre os pobres os trabalhadores mal
pagos misturados aos ladrões, aos escroques e às vítimas da prostituição."
(Citado por BRESCIANI, M. Stella M. Londres e Paris no século XIX: o espetáculo
da pobreza. São Paulo, Brasiliense, 1985, p. 25.)
Outra descrição do bairro East End de Londres, não muito diferente, nos
foi fornecida por Arthur Morrison, na década de 80: "Um lugar chocante,
um diabólico emaramhado de cortiços que abrigam coisas humanas arrepiantes,
onde homens e mulheres imundos vivem de dois tostões de aguardente, onde
colarinhos e camisas limpas são decências desconhecidas, onde todo cidadão
carrega no próprio corpo as marcas da violência e onde jamais alguém penteia
os cabelos." (BRESCIANI, M. S. M., op. cit. p. 26).
Os trabalhadores não gozavam de direitos ou amparo social (como assistência
médica, aposentadorias, pensões), estando sujeitos a multas e castigos;
as greves ou associações de classe eram consideradas "casos de polícia"
e duramente reprimidas pelos governos. A multidão de trabalhadores nas
ruas era uma ameaça à ordem e à moral burguesas, pois nela confundiam-se
indivíduos honestos com bandidos, batedores de carteira, prostitutas.
A multidão representava para a classe dominante uma ameaça as instituições
e à propriedade.
Para os estudiosos e escritores da época, a má quina era responsável
- pelo aumento das riquezas da nação, mas, ao mesmo tempo, pelo desumanização
dos homens. 0 trabalhador, transformado em extensão da máquina, controlado
pelos contramestres e vivendo ameaçado pelo desemprego e pela miséria,
tornou-se um indivíduo rude, turbulento e beberrão; em conseqüência, a
classe trabalhadora passou a ser sinônimo de classe perigosa.
OS PRIMEIROS MOVIMENTOS OPERÁRIOS : Ludismo e Cartismo.
0 crescimento do operariado, a sua concentração nos centros urbanos,
as constantes revoltas por melhores condições de vida e de trabalho fizeram
com que a classe operária aos poucos aprendesse a se organizar, dando
origem aos primeiros movimentos e associações de operários.
Na Inglaterra, onde o emprego da máquina era mais generalizado, surgiu
o Ludismo, movimento que recebeu o nome de seu líder, Ned Ludd. 0 sentimento
de insegurança e os terrores da miséria convenceram Ludd e seus seguidores
da maledicência da máquina, considerada a inimiga principal. Podemos ter
uma idéia do que foi esse movimento, por uma carta ameaçadora que Ludd
endereçou a um certo empresário de Hudersfield, em 1812: "Recebemos a
informação de que é dono dessas detestáveis tosquiadoras mecânicas. Fica
avisado de que se elas não forem retiradas até o fim da próxima semanal
eu mandarei imediatamente um de meus Representantes destrui-las... E se
o Senhor tiver a imprudência de disparar contra qualquer dos meus Homens,
eles têm ordem de Matá-lo e queimar toda a sua Casa". (Citado por RUDÉ,
G. op. cit..p. 92.)
Assim, nas primeiras décadas do século XIX, na Inglaterra, na França,
na Bélgica, na Renânia e até na Suíça, trabalhadores destruíram equipamentos,
aos gritos de "Quebrai as máquinas!" Instintivamente, o homem que para
viver só contava com seu trabalho pessoal, transferia a culpa de seus
males para a máquina, que ele denunciava como uma competidora, responsável
pelo desemprego e pelos baixos salários.
Para atender os casos de acidentes de trabalho, doenças ou mesmo de
desemprego, os operários criaram as primeiras associações de auxílio mútuo,
que funcionavam por meio de cotizações. Dessas associações surgiram os
sindicatos de trabalhadores, reunindo operários de um mesmo ofício. Através
de seus representantes, os sindicatos conseguiam obter dos patrões melhores
salários e horários de trabalho, Essas conquistas foram fruto de muitas
lutas porque durante muito tempo os parlamentos dos diversos países procuraram
dificultar a organização dos trabalhadores proibindo o funcionamento dos
sindicatos.
Em 1832, o Parlamento inglês aprovou o "Reform Act" (lei eleitoral que
privou os operários do direito ao voto). Os trabalhadores reagiram e formularam
suas reivindicações na "Carta do Povo", fundando o primeiro movimento
nacional operário do nosso tempo, o "cartismo" movimento cartista ajudou
os operários ingleses a melhorarem suas condições de vida e deu-lhes experiência
de luta política. Assim, em 1833, surgiu a primeira lei limitando a 8
horas de trabalho a jornada das crianças operárias. Em 1842 proibiu-se
o trabalho de mulheres em minas, Em 1847, houve a redução da jornada de
trabalho para 10 horas.
0 "cartismo" extinguiu-se por volta de 1848, mas foi uma etapa importante
do aprendizado e da conscientização política dos trabalhadores, não só
ingleses como de toda a Europa. Mostrou que a miséria do operariado devia-se
não à máquina ou a mesquinhez pessoal dos empresários, mas à própria estrutura
do sistema capitalista.
Autores:
Olga Maria A. Fonseca Coulon e Fábio Costa Pedro
Apostila: Dos Estados Nacionais à Primeira Guerra Mundial, 1995, CP1-UFMG
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Socialismo Utópico
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