A FORMAÇÃO DO PROLETARIADO INGLÊS

 

 

Autores: Olga Maria A. Fonseca Coulon e Fábio Costa Pedro
Apostila: Dos Estados Nacionais à Primeira Guerra Mundial, 1995, CP1-UFMG

 

Com a mecanização, nasceu o proletariado industrial, formado por homens, mulheres e crianças recrutados entre os camponeses expu1sos das aldeias, os soldados licenciados e sem emprego e os indigentes a cargo das paróquias. Submetidos à disciplina férrea da fábrica, os operários transformaram-se em simples apêndice da produção, agora realizada pela máquina.

Os operários trabalhavam na fiação, na tecelagem, nas vidrarias nas oficinas mecânicas e nas minas. As fábricas pareciam prisões e o serviço era árduo, daí a dificuldade inicial em se encontrar trabalhadores em número suficiente. Os industriais passaram a empregar mulheres e crianças, cujo salário era menor, em larga escala. As crianças, por sua maior flexibilidade e menor porte, eram usadas para puxar as vagonetes nos túneis das minas ou para consertar fios quebrados atrás das máquinas.

As crianças submetiam-se ao trabalho com maior facilidade e eram buscadas entre aquelas amparadas pelas paróquias. Estas faziam contratos com o fabricante que se comprometia a alimentar e educar os meninos e meninas cedidos para o trabalho. Na realidade, os "aprendizes" de paróquias ficavam confinados nas fábricas, isolados da sociedade e ao arbítrio dos patrões. Nos relatos sobre o emprego de crianças nos primeiros anos da Revolução Industrial, não foram raras as denúncias sobre torturas e maus tratos dispensados a elas.

As fábricas impunham uma disciplina de trabalho mais rígida do que a existente nas oficinas manufatureiras. 0 operário foi obrigado a ser assíduo e ajustado às novas necessidades' da produção fabril, com ponto diário de entrada e de saída e descontos nos salários em caso de faltas ou desatenção. As extensas jornadas de trabalho se estendiam por 12 a 16 horas diárias, sem feriados ou férias, não se respeitando nem mesmo os domingos. Acidentes ocorriam com freqüência, devido aos curtos períodos de descanso.

Os horários de entrada e de saída das fábricas eram marcados geralmente pelo toque dos sinos, que na cidade de Manchester começavam a tocar às quatro e meia da manhã. No interior da fábrica, o operário 1 tinha uma função específica e sempre repetitiva, adestrada ao ritmo da maquina e sob a supervisão do contramestre que o ameaçava com multas e despedida do emprego pelo menor erro cometido.

A fome, a miséria e a fiscalização constante impunham disciplina no trabalho, mas uma outra coerção foi muito utilizada: a coerção moral e religiosa. Nesse sentido, o metodismo, religião organizada por John Wesley (1703-1791), teólogo anglicano, teve um papel destacado ao afirmar que as conseqüências da indisciplina poderiam ser, não apenas a demissão, mas algo muito pior, as "chamas do inferno". A salvação do homem estaria ligada aos serviços que ele prestasse a Deus, como bom cristão e, principalmente, pelo trabalho diligente.

Os metodistas fundaram nas paróquias industriais as "escolas do minicais evangélicas", onde se buscavam "serviçais fiéis e bons trabalhadores". Nelas, a recreação consistia em rachar lenha, cavar o solo e aprender hinos cujas letras falavam sempre da presença de Deus como o mais vigilante dos contramestres, Como aos ingleses pobres muito pouco restasse da antiga vida em comunidade, a Igreja oferecia uma oportunidade de convivência, de ajuda mútua e de consolo, Os cultos religiosos levavam, muitas vezes, a histeria, com gritos, desmaíos, exorcismo, etc. Na opinião do historiador Thompson, apesar desse terrorismo religioso o metodismo serviu de base para o surgimento de um movimento de solidariedade entre os trabalhadores, na sua luta por melhores salários durante o século XIX,

 

BURGUESIA INDUSTRIAL E LIVRE -CAMBISMO

0 aparecimento da máquina não só revolucionou o sistema de produção, como transformou os donos de forjas, de fiações e de tecelagens numa forte burguesia industrial. No Lancashire e no Yorkshire, os membros dessa nova classe eram antigos agricultores e tecelões que, com muito esforço, haviam comprado algumas jennies movidas à mão, mais tarde as water-frames e os teares mecânicos. Dessa maneira, conseguiram passar da atividade agrícola para a pequena indústria domestica, desta para a manufatura e da manufatura para a grande indústria.

Os exemplos desses pioneiros são muitos, como nos mostra Paul, Mantoux: Robert Peel, fabricante de fios e de tecidos estampados, deixou uma fortuna imensa com a indústria; Joshua Fielden proprietários, de algumas jennies, Aaron Walker, inicialmente fabricante de pregos, William Hawks e John Parker, antigos ferreiros, tornaram-se grandes industriais.

Os agricultores, os ferreiros, os tecelões, os barbeiros de aldeia que formaram a primeira geração de grandes industriais ingleses, mais do que espíritos inventivos tinham que ser grandes organizadores, buscar sócios, reunir capitais e partir para a contratação de operários. A princípio, a atividade industrial era vista como um risco mui to alto para os bancos aplicarem seus capitais; os banqueiros ingleses preferiam emprestar seu dinheiro aos comerciantes, aos agricultores e ao governo do que investir na indústria.

No período compreendido entre meados dos séculos XVIII e XIX, a indústria consolidou-se e a burguesia industrial inglesa ascendeu socialmente. 0 burguês tornou-se um "gentleman", possuidor de belas propriedades no campo e na cidade, elegendo seus representantes para o Parlamento e conseguindo estudo para seus filhos nas melhores escolas e universidades. Para fazer prevalecer seus interesses industriais, a burguesia defendia a idéia de quê o enriquecimento individual representava a felicidade e o bem estar de todos e da nação.

Os industriais passaram a pleitear a liberdade de comércio e o fim do protecionismo alfandegário existente sobre os produtos agrícolas, argumentando que a livre importação de cereais a preços mais baixos que os produzidos na Inglaterra seria um dos meios de se acabar com a miséria dos trabalhadores. Os grandes proprietários de terra eram contra, afirmando que nada disso valeria para o operário, pois, com os alimentos mais baratos, os industriais acabariam por reduzir os seus salários. A polêmica envolvendo as elites agrárias e industrial terminou com a aprovação, em 1846, pelo Parlamento, de leis que eliminavam o protecionismo econômico e instituíam o livre- cambismo na Inglaterra.

Autores: Olga Maria A. Fonseca Coulon e Fábio Costa Pedro
Apostila: Dos Estados Nacionais à Primeira Guerra Mundial, 1995, CP1-UFMG

 

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