CRÔNICAS
7. Amigo, amante e companheiro

Tenho 54 anos. Na minha infância tive apenas duas pequeninas aventuras com o mesmo sexo: a primeira com um pretinho que morava na casa de minha avó, nós dois brincando de pegar no pintinho um do outro, algo do tipo segurar num objeto proibido. A outra vez, na fazenda de minha tia Prazeres, em Araçariguama, eu passando a mão na bunda do filho do dono da venda. Coisa de criança sapeca. Minha primeira transa homossexual de verdade, com ejaculação e orgasmo foi somente aos 18 anos - uma lástima, pois morro de inveja desses moleques que se iniciaram na descaração desde pequeninos
Portanto, nestes últimos 36 anos que prática homoerótica, calculei que devo ter transado mais ou menos com uns 500 homens diferentes, incluindo 4 ou 5 casos prolongados, variando de1 a 16 anos, como este meu atual relacionamento, o mais prolongado de minha vida. Que o leitor mais jovem não me julgue o rei da putaria, pois na minha época e com a minha idade, tem muito gay que teve mais de mil transas diferentes. Antes da Aids era assim.
Vivo feliz com meu companheiro, e apesar de tantos anos juntos, ainda sentimos grande tesão um pelo outro, com duas ou três fodas semanais que às vezes terminam com gritos tão incontrolados de prazer, que temos de fechar as janelas da casa para não incomodar os vizinhos.
Não quero nos tomar como exemplo ou modelo para ninguém, pois em questão de sexo e amor, não há receita fixa, cada casal enconrando sua melhor forma de manter viva a relação. Contudo, compartilhar experiências de vida pode ajudar os menos experientes ou iniciantes a encontrar seu próprio caminho para a felicidade. Porque, mesmo reconhecendo ser perfeitamente possível alguém viver feliz sem ter uma cara metade ao lado, nós todos, seres humanos, heterossexuais, gays, lésbicas, bissexuais, se pudéssemos escolher, a grande maioria dos solteiros ou dos que não estão namorando, no fundo, prefeririam estar vivendo um grande amor, ter um caso fixo, amar e ser amado por alguém. O que não significa necessariamente viver debaixo do mesmo teto com a pessoa amada. Nem fidelidade e monogamia exclusivas. Nem ficar todas as noites assistindo televisão juntos . Tem muitos casais que adotam esse estilo de vida, e se se sentem bem, ótimo! Mas outros, mesmo se amando perdidamente, não abrem mão do estilo de vida de solteiro: não gostam de viver juntos, preferem os bares e ambientes noturnos, costumam repetir que se os olhos não vêem, o coração não sente. Tudo bem: cada qual no seu cada qual, e se os dois estão de acordo e felizes, viva Jesus!
Isto posto, vou ao essencial: seja qual for a relação sexual-afetiva que se tenha, seja do tipo mais caseiro e exclusivo, seja do tipo mais rueiro e aberto, para que uma relação seja plenamente satisfatória, duradoura e que faça a gente crescer, cada um tem ser para o outro: amigo do peito, amante apaixonado, companheiro alegre. Esta é minha receita para a felicidade.
A ordem destes três ingredientes geralmente começa pelo tesão. O que move nosso olhar e interesse por alguma pessoa é o prazer, o gosto que sentimos em apreciar algum detalhe físico, seja a beleza do rosto ou do corpo, os olhos, a presença ou ausência de pelos, o volume do sexo, a bunda arrebitada, etc, etc. Portanto, para manter uma relação amorosa, o tesão está na origem e sem ele, é muito difícil conservar esse relacionamento forte e apaixonado. E sem tesão e paixão, o caso vira rotina, perde o viço, fica chato. Aí as outras pessoas passam a nos atrair cada vez mais, e fatalmente chega o dia em que aquela atração inicial se transforma em indiferença, chegando até a repulsa.
Para quem não quer chegar a esta desagradável situação, o jeito é investir no erotismo, variar as posições, descobrir novos prazeres e sensações, apimentar ou adocicar o bate-cocha. E dou aqui meu depoimento de quem já transou mais de 1.600 vezes com a mesmo homem (duas vezes por semana multiplicado por 16 anos): é perfeitamente possível manter uma vida sexual ultra satisfatória (a ponto de ter de fechar as janelas para que nossos gritos e sussurros não invadam as casas dos vizinhos) , mesmo após 15 anos fodendo com a mesma pessoa. Se não fosse assim, juro por Ganimedes que tanto eu quanto Marcelo já teríamos saltado fora.
O segundo ingrediente indispensável para se manter viva uma relação afetivo-sexual é a amizade. Meu amante tem de ser meu melhor amigo, meu amigo do peito, pois se for apenas bom de cama mas na hora que preciso de seu apoio, ele se manca, então, vai desculpando, mas prefiro pagar um profissional do sexo e foder gostoso, sem nutrir a ilusão e falsa expectativa que meu amante também é meu amigo. Amizade é fundamental, amizade mesmo, não só na alegria mas também na tristeza. Como diz meu Marcelo: eu mato e morro por você! E eu por ele!
O terceiro atributo vital para se viver um grande amor é ser companheiro alegre um do outro. Para se viver prazerosamente junto com outro pessoa, além de tesão e amizade, tem de encontrar no outro a companhia agradável de alguém que goste de curtir junto as alegrias do dia a dia, do fim de semana. Andar de mão dada, ombro no ombro, ir ao cinema juntos, viajar, ir ao aniversário de amigos comuns, tudo isto quando compartilhado com alguém que se ama e que está alegre e feliz ao seu lado, é fonte de grande prazer e satisfação. Um amante ou amigo carrancudo junto de si é um pé no saco.
Moral da história: o amor existe e é lindo, basta procurar, estar aberto, dialogar. Quem vivenciou a felicidade de encontrar numa só pessoa um amigo do peito, um amante apaixonado e um companheiro alegre - sabe muito bem que este é o bem mais precioso da vida para se guardar do lado esquerdo do peito...

Voltar