DUAS ROSAS E UM ESPINHO
Por: jaime nunes mendes

Numa estreita rua de uma pequena cidade existiam duas ROSAS.
A primeira, que habitava bem no princípio da rua, ornamentada de cores vermelhas, estava sempre patente aos olhos dos que ali transitavam. A outra, que vivia numa simples casinha no extremo dessa mesma rua, raramente era vista. Contudo, aqueles que tinham o privilégio de vê-la ficavam como que encantados com tão rara e distinta beleza. A leitora concluirá por si mesmo que esta última ROSA era uma formosa mulher. Mas não era uma mulher qualquer. Havia nela algo que a destacava sobremaneira das outras que por ali moravam, alguma cousa deveras singular. No entanto, o que a tornava assim tão distinta estava muito além dos seus perfeitos traços físicos. Ela tinha um encanto que emanava do profundo de sua alma, e tal de maneira que a todos causava admiração.
Moravam também nesta mesma rua dois distintos mancebos, que, além de estarem unidos pelo mesmo vínculo afetivo, estavam também ligados pelo mesmo sonho: ambos buscavam colher a mesma flor, um e outro almejavam conquistar a mesma mulher. Assim, por causa desta incompatibilidade rompeu-se tão duradoura amizade, e o longo sentimento de afeição entre eles precipitou-se em ruína...
Enquanto isso, ROSA, a mulher-flor, que já sabia da disputa, estava com seu coração dividido. “Qual dos dois será o homem da minha vida?”.  Ela estava realmente indecisa. Porém, numa determinada ocasião, ROSA tomou uma drástica decisão: – Será hoje, disse ela para si mesma. – Hoje saberei quem há cuidar do meu florido jardim! Pela ação de cada um, entregarei meu coração!
Enquanto isso, os dois mancebos, já grandes inimigos, resolveram firmar um pacto:
- Será hoje, disse o primeiro. - Hoje saberemos em qual coração ela há de morar!
- Sim, repetiu o outro. – Hoje um coração ficará ferido!
O pacto feito consistia no seguinte: Conforme previamente combinado, um deveria visitar ROSA pela tarde e o outro faria o mesmo à noite. E, conforme propuseram, aquele de quem mais se agradasse moça, esse seria para sempre dela.
Bem. Chegou Domingo, o dia tão esperado. O relógio deu três horas. O primeiro mancebo, devidamente preparado em seus trajes, partiu para sua mais importante missão.
Seguindo a estreita rua, vislumbrou, de início, a roseira em todo o seu esplendor vegetativo. Porém, ignorando-a seguiu em frente com grande ansiedade e confiança.
Deram seis horas, ele já estava de volta:
Agora é sua vez, disse ao outro. E completando: – Já fiz a minha parte. Pelo que sentir (isso ele dizia com visível excesso de confiança)  sua missão será quase impossível. E, irônico: - Sucesso!
Deram seis horas. O crepúsculo estava radiante. O segundo mancebo, não tão bem trajado quanto o outro, saiu com o coração deveras ansioso.
Iniciando sua árdua missão, viu, no começo da ruazinha, a mesma roseira que o outro vira. Ele não pensou duas vezes. Sem se importar com os espinhos, fez despegar do caule uma flor, e isso lhe causou o derramamento de algumas gotas de sangue. Em seguida, continuou a viagem...
Amanheceu o dia e nada dele voltar. O primeiro mancebo, angustiado e preocupado, decidiu-se por ir até lá, à casa de ROSA, para ver o que havia de fato acontecido. Foi e lá chegou... Mas ninguém estava lá. Contudo, viu por sobre uma mesinha, ao lado de um velho fogão à lenha, algo escrito num simples papel de embrulhar pão. E leu: “Meu amigo, como já previa que você aqui viria, resolvi deixar-lhe algo para sua meditação: uma flor é só uma flor para quem só dela sente o seu odor; entretanto, para quem percebe nela alguma cousa além de seu agradável aroma,  uma flor é uma antídoto contra a indecisão. A rosa que apanhei no princípio desta rua, conduziu-me ao coração da ROSA com quem, hoje, ei de me casar”.
Aquele mancebo tinha razão. Um coração haveria de ficar ferido. Foi o seu mesmo.



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