Vida e Obra de Bernardo Guimarães
  poeta e romancista brasileiro [1825-1884 - biografia]

 
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Capítulo 24 do livro inédito
"Bernardo Guimarães, o romancista da Abolição"

Egresso das cátedras
Armelim Guimarães

Felício Buarque, no “Almanaque Alves” de 1917, depois de dizer que as aulas confiadas a Bernardo era “um dos meios de proteção que lhe concedia o Governo”, “com o generoso intuito de animá-lo nas incertezas de seu precário viver”, informa que o poeta e romancista mineiro nunca dera aula alguma “por espaço de alguns anos, embora residisse na mesma localidade”. É esse outro perverso exagero, senão mesmo mentira atirada à biografia de Bernardo Guimarães! Desmentia-o Teresa Guimarães. Vamos até admitir não ter sido ele, nos últimos tempos, por precariedade de saúde, e, sobretudo, por estafas de longas viagens, não ter sido o poeta um professor dos mais assíduos, o Colégio de Congonhas, e ultimamente, no de Queluz.

Parece-me que a partir de 1877 já Bernardo Guimarães havia abandonado, de vez, o magistério. Passou, desde então, a viver dos caraminguás que lhe rendiam esporadicamente os direitos autorais. O Garnier era seu patrão...

As aulas de Bernardo andavam com urucubaca. As cadeiras de Retórica e Poética do Liceu de Ouro Preto havia muito estavam suprimidas. As de Filosofia e Literatura do Colégio de Congonhas foram fogo de palha. A Queluz não iria mais.

A advocacia, já tinha mesmo mandado às favas. Cargos de nomeação do Governo, nem queria ouvir falar nisso! Da política fugia como o diabo foge da cruz. Nem pensar queria em seguir ao pai, que fora parlamentar em vários períodos legislativos na Assembléia Provincial, embora lhe acenasse com propostas e certos favoritismos de mão beijada, que outros não rejeitariam. E não seria nem cascudo nem ximango. Permaneceria um independente. Entregar-se-ia inteiramente às letras e às musas, nem que para tanto fosse preciso passar à água e angu.

Também o mano Joaquim Caetano (1813-1896) já lá estava na boa terra, como desembargador da Relação de Minas Gerais, “da qual foi presidente, assumindo o exercício do cargo em 3 de dezembro de 1874”. (Laurêncio Lago, “Supremo Tribunal Federal e Supremo Tribunal de Justiça”, Rio, 1940, página 134).

Em 1876, na Paulicéia, era o sobrinho de Bernardo, o Antônio Augusto de Ataíde, quem termina o curso jurídico.

Mas essa nova quadra da vida de Bernardo Guimarães não começava bem. Um tragédia ocorre, então, no lar do escritor.

Alarma-se D. Teresa, e com elas as mucamas e D. Felicidade. É que o primogênito, João Nabor, estorce-se com dores e cólicas, rolando-se sobre o leito. Bernardo corre ao quarto do menino. Percebe-lhe no rosto a catadura da morte. Por um pequeno frasco que a criança comprime às mãos, adivinha-se o mal: ingerira inadvertidamente uma forte dose de estricnina. O vidro, achara-o momento antes em casa de sua tia Germana, esposa do Dr. Calisto Arieira, médico e farmacêutico. Inocentemente, João Nabor enchia-o de água, que bebia em seguida.

Quis o infortúnio que isso ocorresse no dia da mentira, 1º de abril. Era 1878. Bernardo, sem perda de tempo, manda um serviçal pedir a urgente presença do concunhado, o Dr. Calisto. O clínico, entretanto, homem austero e grave, e que há havia caído em divertidas maroteiras do pândego boêmio, recusa-se, em face da data que é, em atender ao chamado insistentes. Sabe o médico que, para uma boa pilhéria de 1º de abril, o concunhado poeta será capaz de brincar até mesmo com a Parca!

Diante da recusa e da premência do socorro, o romancista, corpulento e forte, pessoalmente vai à casa do esculápio, que não era longe. Segura-o pela gola do paletó, e leva-o à força, quando arrastando-o, para atira-lo ao leito do filho moribundo.

O jornal sul-mineiro “O Itajubá”, na edição de 14 de abril de 1878, transcreve da “Atualidade”, do Rio de Janeiro, a notícia pormenorizada desse infausto, segundo a qual houve o comparecimento de três outros médios, os Drs. Carlos Thomaz, Serrano e Francisco de Magalhães. Nada, porém, puderam fazer para salvar o menino.

Bernardo Guimarães, em toda a sua vida, jamais experimentara tamanha dor. Carlos José dos Santos nos fala do abalo que o escritor sofreu “com a morte do seu filhinho João Nabor”, falecido aos dez anos de idade. Era – diz esse íntimo companheiro do poeta – “uma criança interessantíssima”.

João Nabor foi sepultado no cemitério anexo à igreja de São José, necrópole que, seis anos depois, também receberia os despojos do pai do menino.

Amuado, triste e desalentado, viveu Bernardo algumas semanas de abstinência de letras e de musas. Mas o tempo cicatriza as feridas da alma. Aos poucos o escritor foi retomando sua ferramenta de trabalho. Por essa época mandava ele para o Rio de Janeiro sua colaboração para o “Jornal do Comércio” e para a “Revista Brasileira”, na qual, em 1880, publicou o poema “A Camões”.

Embora vivendo sob o peso fatídico do tédio que a idade, as doenças e os túmulos lhe ia trazendo, não perdia nenhuma oportunidade para vibrar as cordas de sua harpa jocosa e genial. Diante de qualquer eventualidade, e por motivo às vezes de mínimos acontecimentos, improvisava versos interessantíssimos e perfeitos. Quase todas essas produções se perderam. Ao menos um de seus amigos, Aurélio Pires, lembra-se de algumas dessas rimas. Conta-nos ele:

“Em 1881, achando-se como habitualmente acontecia, em uma república de estudantes (de Farmácia) da velha capital mineira, como o criado perguntasse, em presença do poeta, se podia servir o almoço, Bernardo Guimarães incumbiu-se de responder-lhe, o que fez do seguinte modo:

 

Traga já esse almoço,
Moço!
E não faça como a indigente,
Gente,
Que traz, em vez de pipote,
Pote,
E bebe, com grande mágoa,
Água!,
Do que eu gosto é de cerveja,
Veja,
Também tomo, com deleite,
Leite,
E como frutas maduras,
Duras.
Traga, já, qualquer quitanda!
Anda!
Que a gente lambisqueira
Queira
Semelhante gulodice...
Disse.
 

Observe-se que a palavra “quitanda”, empregada pelo poeta neste improviso, era usada, em Minas – e ainda o é em cidades pequenas e nas roças – na acepção de biscoitos, broas, pão, bolos e sequilhos.

Bernardo Guimarães já havia, nos seus dias de acadêmico brincalhão, criado o bestialógico, nos últimos anos de sua vida engendrou esta outra modalidade poética – os versos monossilábicos em eco. Esse também é o caso da longa balada Gentil Sofia.  


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Joaquim Caetano, irmão de BG,
fez carreira no Judiciário